A
dignidade da pessoa humana é um valor constantemente afirmado pela
sociedade como o valor fundamental, do qual emanam todos os outros
valores que possibilitam a sobrevivência e a ordem social. Desse modo,
esse valor abarca o direito à vida; porém, também o direito à liberdade.
Nesse ponto, temos um embate de princípios: mais importante é preservar
a vida de um ser humano mesmo contra a sua vontade (ou a de seus
responsáveis) ou primar pela liberdade de escolha diante da situação
degradante, ou de “quase-morte”, do indivíduo?
Deve-se
analisar, primeiramente, a disponibilidade de ambos os valores e o grau
de importância destes, especialmente para a pessoa humana (ou seu
responsável) que se enquadra na situação polemizada. Isso porque, nesse
caso, a possibilidade de escolha entre uma “morte digna” e continuar
vivendo, mesmo em condições de estado vegetativo, não afeta
concretamente o restante da sociedade, embora possa gerar influências
positivas ou negativas.
A constituição brasileira vigente garante o direito à vida e à liberdade, no seu artigo 5º, caput. Mas, no inciso XLVII do mesmo artigo, coloca uma hipótese de disponibilidade pelo Estado daquele direito fundamental:
“XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; (...)”
Se
o Estado, que é a representação legítima do povo - o qual, por sua vez,
é a sua fonte de soberania - pode dispor da vida de qualquer cidadão em
determinada situação, quanto mais o próprio “dono” desse bem
fundamental: o indivíduo.
Assim,
pode-se afirmar da quase sempre indisponibilidade do valor da vida,
mas, quanto à liberdade, enquanto valor fundado e fundador da dignidade
da pessoa humana, este sim é um direito inarredavelmente indisponível e
formador da personalidade e autodeterminação de todo cidadão.
Partindo
desse raciocínio, é possível a incorporação e a institucionalização do
“direito de morrer” pelo ordenamento jurídico brasileiro, desde que se
admita, conforme José Afonso da Silva afirma, emenda constitucional ao
artigo 60, § 4º, inciso IV da CF/88, que veda a deliberação de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais, já que o direito à vida é posto no caput do art. 5º como inviolável.
Por
outro lado, se o direito à liberdade não fosse um princípio tão aberto a
interpretação, diríamos que, ao cerceamento do direito de morrer, ou à
“morte digna”, caberia controle de constitucionalidade, visto que a
liberdade também constitui direito fundamental inviolável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário